Aplicação do princípio da insignificância na lei de drogas

Recentemente, ocorreu a absolvição de uma mulher que foi condenada à pena de seis anos, nove meses e vinte dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, pela posse de um grama de maconha. Divergindo da posição majoritária do STJ e do STF, a 2ª turma da Corte Suprema entendeu, por maioria, pela possibilidade da aplicação do princípio da insignificância no caso em apreço, ou seja, aplicou o princípio da bagatela em crime da lei de drogas.

Há quem entenda pela impossibilidade de aplicar a insignificância aos crimes elencados na lei de drogas em razão de se tratar de crime de perigo abstrato. Sabe-se que, para que haja crime, é necessário que o bem jurídico protegido por aquele tipo penal seja lesionado.

Contudo, quando há a probabilidade de lesão ao bem jurídico, também pode ser considerado crime, em razão do perigo abstrato, ou seja, o legislador entendeu que determinada conduta, caso seja praticada, causará um risco de lesão ao bem jurídico. Entende-se, portanto, pela punição em razão do comportamento perigoso.

Na lei de drogas, os bens jurídicos protegidos são: a segurança, a saúde pública e a paz social. O cidadão, ao realizar quaisquer dos verbos descritos nos crimes previstos na lei, colocará a segurança e a saúde pública em risco, bem como a paz social.

Os tribunais superiores têm entendido que, em razão da conduta, colocar em risco os bens jurídicos tutelados, impossibilita considerar inexpressivo o risco, bem como ausente de periculosidade social. Porém, esse não foi o entendimento que prevaleceu no HC 127.573, julgado pela 2ª Turma do STF.

No voto do relator, ele, acertadamente, entendeu que se deve evoluir quanto à aplicação da insignificância na lei de drogas. Não obstante ser um crime de perigo abstrato, a mera conduta não nos revela se realmente o bem jurídico foi colocado em risco ou não. É necessário mostrar a real probabilidade de a conduta ser um risco ao bem jurídico protegido.

Um ponto a ser observado é quanto à proporcionalidade como princípio basilar para aplicação do direito penal. O legislador, ao exercer seu mister e preceituar sobre direito penal, terá que observar se a conduta é suficiente para proteger o bem jurídico, se não é excessiva ou deficiente. De igual forma, o julgador, ao aplicar a pena, deverá observar o princípio da proporcionalidade, a fim de evitar penas excessivas ou deficitárias à proteção do bem jurídico.

A conduta de portar um grama de maconha não causa a probabilidade de riscos à segurança e à saúde pública e nem afeta a paz social. Muito menos é necessária e adequada, tornando-se, inclusive, excessiva uma pena de seis anos ou, até mesmo, o mínimo previsto em lei (5 anos) a quem tenha a posse de um grama de maconha.

Mediante o exposto, feliz foi a decisão da 2ª Turma, em evoluir e aplicar a insignificância à conduta considerada inexpressiva a causar risco de lesão ao bem jurídico.

Em outros tempos, houve a condenação em um ano e oito meses de uma pessoa que portava 0,2 gramas de crack, isso porque o STJ reduziu a pena, que era de dois anos e seis meses de reclusão, em regime inicial fechado, no HC 155.391.

É fulcral recordar que, em 2012, no HC 110.475, a 1ª Turma do STF, entendeu pela ausência de tipicidade da conduta a uma pessoa que estava de posse de 0,6g de maconha, aplicando o princípio da insignificância. O relator da decisão foi o Ministro Dias Toffoli.

Não é possível que a posse ou porte de 0,2 ou 0,6 gramas de substância possa trazer instabilidade à segurança ou à saúde pública. É preciso entender que o crime de perigo abstrato não é crime de mera conduta. É necessário verificar se existe a real probabilidade de causar um risco ao bem jurídico e, não a constatando, considerar atípica a conduta, em razão do princípio da insignificância.

Artigo publicado no site MPJUS.

Autor: David Metzker.

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